A expansão do Comando Vermelho (CV) se estabelece como um dos principais desafios para as forças de segurança pública do Brasil, com a facção criminosa, que surgiu há quase 50 anos no Rio de Janeiro, tendo extrapolado sua atuação e estabelecendo alianças com o antigo rival, o Primeiro Comando da Capital (PCC), e com cartéis internacionais.
Uma megaoperação no Rio de Janeiro nesta semana resultou na apreensão de cerca de cem fuzis, dando uma dimensão do arsenal que a facção detém. Investigadores do estado do Rio de Janeiro apontam que, em anos recentes, pode ter havido uma colaboração pontual entre o CV e o PCC para explorar o mercado formal no Rio de Janeiro, como postos de gasolina, para a lavagem de dinheiro, mesmo após o fim da trégua oficial entre as facções, em abril.
O surgimento e a consolidação do Comando Vermelho
O Comando Vermelho nasceu dentro do presídio em Ilha Grande, no litoral do Rio de Janeiro, em 1979, durante o regime militar. Inicialmente conhecido como Falange Vermelha, o grupo surgiu do convívio com presos políticos na cadeia, com o plano de criar uma "irmandade" entre os detentos.
O grupo rapidamente passou de reivindicações para atividades criminosas externas, como o tráfico de drogas e assaltos a bancos, tornando-se o Comando Vermelho.
A partir dos anos 80, a facção passa a controlar territórios e dominar pontos de venda de drogas no Rio de Janeiro, e, na década de 90, já controla a maior parte do tráfico nas favelas cariocas. Nesse período, surgem as milícias, compostas por grupos de policiais e ex-policiais corruptos, iniciando uma guerra por poder e territórios que perdura até hoje.
Atuação na Bahia e na Amazônia
A facção expandiu sua atuação para outros estados. A Bahia se destaca como o estado com o maior número de facções em atuação no país, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
No Nordeste de Amaralina, em Salvador, a chegada do CV há cinco anos foi celebrada com fogos de artifício por traficantes, transformando o extinto Comando da Paz em uma das filiais do grupo carioca. A aliança, considerada uma das mais complexas já enfrentadas pela Secretaria de Segurança Pública da Bahia, surgiu para fazer frente ao avanço da maior facção do estado, o Bonde do Maluco (BDM).
Pelo menos doze bairros de Salvador, incluindo Engomadeira, Saramandaia, Mirantes de Periperi, Liberdade, Alto das Pombas, Mussurunga, Vila Verde, Iapi, Sussuarana, Alto da Terezinha, Tancredo Neves e Vila Laura, estão sob domínio do Comando Vermelho, enquanto em outros quatro há divisão de controle com outros grupos criminosos.
O cenário de violência e disputas territoriais tem impacto direto na vida dos moradores. Em abril deste ano, seis carros de moradores no bairro de Lobato foram incendiados durante uma noite de ataques pela disputa territorial. Em Camaçari, em outubro do ano passado, os irmãos Gustavo, 24 anos, e Daniel Natividade, 15 anos, foram mortos após, segundo investigações, um integrante do CV confundi-los como inimigos por terem postado uma foto com gestos associados ao BDM. A violência na Bahia liga o alerta de autoridades e guias de turismo, que orientam turistas a evitar gestos ou poses que possam ser associados às facções.
Na operação desta semana no Rio de Janeiro, pelo menos 28 baianos foram localizados e presos, e quatro morreram, sendo um deles apontado como o elo do Comando Vermelho na Bahia.
O delegado-geral da Polícia Civil da Bahia, André Viana, afirma que a desarticulação de mais criminosos traz tranquilidade, mas reconhece que as maiores lideranças estão em outros estados, "principalmente Rio de Janeiro". Ele ressalta que a Polícia da Bahia repassa informações para o Rio de Janeiro para que possam realizar ações no estado e espera apresentar novos resultados para a população.
Outro desafio é no Amazonas, onde o CV e o PCC atuam em conjunto com cartéis da Colômbia e do Peru para escoar cocaína. A droga é transportada pelos rios da região até o Pará, de onde segue para a África, Europa e Ásia. A Secretaria de Segurança Pública do Amazonas já apreendeu mais de 37 toneladas de drogas neste ano.
A diretora do Sindicato da Polícia Civil do Rio de Janeiro, Taissa Guimarães, afirma que o problema do crime organizado no Brasil se tornou uma questão de segurança nacional, com o epicentro no Rio de Janeiro. Ela defende a união da segurança nacional e o auxílio logístico e financeiro para combater o crime que se alastrou de forma desenfreada.
A colaboração no crime e a lavagem de dinheiro
O Comando Vermelho, que passou por um período de aliança e posterior rivalidade com o PCC, parece ter se aliado novamente.
O secretário de Polícia do Rio de Janeiro fala sobre o uso de postos de gasolina no Rio de Janeiro para o PCC lavar dinheiro, enquanto o Comando Vermelho estaria utilizando rotas de tráfico do PCC.
Em alguns locais, após o rompimento da trégua oficial em abril, houve celebrações de traficantes anunciando a nova configuração de alianças, com parcerias sendo reestabelecidas entre o Terceiro Comando Puro (TCP) e o PCC.